terça-feira, 18 de agosto de 2009

Apenas a guerra merece fidelidade


Caminhava pela rua trazendo um sorriso estampado radiante em seu rosto, embora a guerra tivesse lhe tirado a juventude e o ânimo predominantes, traços de sua antiga beleza destacavam-se por entre as olheiras e os fios grisalhos. No braço esquerdo trazia uma mochila com pouquíssimos pertences, entre eles seu uniforme de soldado que havia lhe proporcionado muitos méritos e com a mão direita trazia um par de rosas vermelhas que escorregavam por entre os tocos dos dedos que lhe restavam. No bolso interno da camisa carregava a foto de sua bela esposa, um sorriso gracioso e um olhar apaixonado que encarava seu fotógrafo, o retrato possuía inúmeros riscos brancos devido a quantidade de vezes que havia sido desdobrado, não cansava de olhar aquela imagem, era como um colírio para os olhos depois de uma maré de sofrimento.
Agora estava bem à frente de sua casa, seu lar. O coração acelerava teimando em saltar pela boca, suas pernas estremeciam e vacilavam ao subir os degraus da escada. Uma força surpreendente lhe invadia o peito, há quanto tempo esperara por aquele momento? Há quanto tempo desejara ardentemente rever aquele cabelo comprido, aquela boca avermelhada?
Experimentou a porta, estava destrancada. Entrou lentamente evitando ao máximo qualquer rugido ou som que anunciasse sua presença, avançou pela sala e encontrou espalhadas pelo chão algumas roupas e peças íntimas tanto feminina como masculina que seguiam em direção ao quarto. Seu olhar apaixonado e saudoso agora se transformara em cólera e repúdio, depositou sua mochila devagar no chão, tirou os sapatos e  dirigiu-se para junto da promíscua.
Estavam na cama envoltos por um sono profundo, ele a enlaçava com o braço direito e com o oposto pousava a mão em sua barriga. Em seu descanso ela nem imaginava que ele havia regressado e ele não podia acreditar que ela fora capaz de tamanho adultério.
Em silêncio pegou o retrato que guardava com tanto carinho e despedaçou-o em quatro pedaços, junto com as pétalas de rosa despejou-os nos pés daquela infame e com uma lágrima ofendida saiu pela porta aberta.
Apenas a guerra merecia fidelidade.

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